10 janeiro, 2012

Cena 1

Uma dor na fronte, de cabeça, mas incidente, com força na testa, de onde saem as preocupações, os pensamentos presos, enjaulados, por causa de vozes penetrantes, características, do quarto ao lado, tipo trombones, que entram pelos ouvidos, dão trinta voltas em torno do cérebro e fixam-se na fronte, dissolvendo-se, desgastando.
Abro a janela, corre vento frio, atinge-me a cara sem piedade, mas as minhas expectativas saem frustradas, não levam nenhuma das dorzinhas, das pressões, são só minhas e o dia ainda vai a meio. Sonho com a hora de dormir e quando me deito não sonho com nada, só um quadro preto de absolutamente nada, uma espécie de morte de que me admiro todas as manhãs. Tomo banho, lavo os dentes, como uma torrada, vejo as notícias, saio à rua. O sol é lindo, o calor arrepia-me a pele, caminho durante hora e meia com o casaco no braço, porque afinal não foi preciso. As gaivotas cantam, as pessoas alegram-se com o que passa, a arquitectura manuelina levanta as saias complicadas e eu tiro uma fotografia para memória futura, nem há necessidade de Photoshop, porque ainda que estivesse rebentada, seria sempre o momento que eu pari e da terra de onde eu venho não se fazem abortos.

Sem comentários:

Enviar um comentário